3 January 2008

CORAGEM - PARTE 2

Até 21 de Fevereiro do ano passado Wafa Sultan era uma perfeita desconhecida. Nesse dia deu uma entrevista à Al-Jazeera, que se por um lado a transformou numa celebridade, por outro também a tornou um alvo a abater pelos árabes.
A entrevista correu Mundo graças à Internet, apareceu no You Tube e aterrou directamente no New York Times, no Los Angeles Times e na CNN.
Foram milhões as pessoa que receberam por mail o vídeo do You Tube, e eu fui uma delas. Confesso que fiquei espantada e lembrei-me de Salman Rushdie por quem nunca tive muita simpatia, embora não discuta o livro que fez os Ayatollahs condenarem-no à morte.
Decidi ir saber quem é Wafa Sultan e eis o que descobri:
A Dr.ª Sultan é uma psiquiatra Síria, agora naturalizada americana, que vive na Califórnia desde 1989, altura em que deixou a Síria com a família.
Nasceu em Banias, uma cidadezinha da Síria, mais ou menos a duas horas de Beirute, numa família profundamente religiosa e seguiu de forma rígida a fé do seu pai até à idade adulta.
A sua vida mudou em 1979, era estudante de Medicina na Universidade de Aleppo, no norte da Síria.
Nessa altura, o grupo radical Muslim Brotherhood usava o terrorismo para minar o governo do Presidente Hafez al - Assad.
Uma tarde, terroristas desse grupo invadiram a sua sala de aula e mataram o professor em frente dos alunos. Ela era um dos alunos.
“ Eles dispararam centenas de balas nele, gritando: - Deus é grande. Nesse momento perdi a fé no Deus deles e comecei a questionar todos os seus ensinamentos. Foi a viragem na minha vida e o que me trouxe ao dia de hoje.
Tinha que partir.
Tinha que procurar outro Deus”
E assim fez.
As frases mais emblemáticas da entrevista foram, por exemplo:
- O choque a que assistimos no Mundo é um choque de mentalidades: uma que pertence à Idade Média e outra ao século XXI. É um choque entre a liberdade e a opressão, ou
- Acredito que o nosso povo é refém das suas crenças e dos seus ensinamentos. Estudar livrou-me desse pensamento arcaico. Alguém tem que libertar o povo árabe destas crenças erradas.
Mais grave foi ter comparado os Judeus com os árabes, sendo que estes perdem na comparação.
Disse ela falando do Holocausto: “Os Judeus saíram dessa tragédia e obrigaram o Mundo a respeitá-los, com a sua sabedoria e não com terror; com o seu trabalho e não chorando e gritando. E continuou: “ Nunca vimos um judeu suicida explodir um restaurante alemão. Nunca vimos os judeus protestarem matando gente.
E concluiu: “ Só os àrabes defendem as suas crenças queimando igrejas, matando gente e destruindo embaixadas. Este caminho não levará a lado nenhum. Os árabes têm que perguntar a si próprios o que podem fazer pela humanidade, antes de exigirem que a humanidade os respeite.
É claro que as reacções a esta entrevista, por parte do mundo árabe, foram a condenação à morte e terríveis ameaças deixadas no seu atendedor de chamadas.
Mas os árabes reformadores, louvaram-na por dizer alto e bom som, e em árabe na televisão mais vista no mundo árabe, aquilo que poucos árabes têm coragem de dizer em privado, nas suas casas.
Tem 47 anos, veste de forma simples e ninguém supunha que tivesse coragem para isto. Agora está a trabalhar num livro cujo título será “ The Escaped Prisoner. When God is a Monster ” que promete virar o Mundo árabe de pernas para o ar.
Mas ela justifica-se com esta frase que parece simples: “ Cheguei a um ponto de não retorno. Não tenho escolha. Neste momento questiono, um por um, os ensinamentos do livro sagrado."


Quando penso que na Europa e no nosso País, tanto temos para põr em questão, para lutar, para contestar, para exigir, para denunciar e nada fazemos, sinto-me um rato.
Porque afinal, nós não arriscamos nada, e estas mulheres arriscam a vida.
Das duas uma, ou não temos ideais ou não temos coragem!



Coragem Parte 1: Post sobre Benazir Bhutto.

16 nhận xét :

irneh said...

Olá

Possivelmente não temos coragem. Acomodámo-nos. Ou o nosso mundo é um pouco melhor, sei lá.

Beijinhos e bom ano de 2008.

@ღღ@ said...

A propósito de coragem, ainda não entendi porque é que o assassino do Mauricio Levy (cujo nome nem sequer apareceu, deve ser para não sujar o senhor) esta repimpado em casa ! Sera que estou a ver mal o filme ? Sera que não vou ou não vamos fazer nada ?
Então nesse pais esfaqueia-se um amigo so por ciumes, ainda por cima não fundados, e depois fica-se a ver televisão em casa ? Alguém me sabe explicar ?

Divinius said...

Escuta o som mais puro da tua voz...)*

Mago da Lua said...

Excelente este seu post....parabens.
Eu não tinha uma noção completa do caso. Vou voltar.

Sol da meia noite said...

Mundos diferentes, vivências diferentes, implicam diferentes modos de agir. Penso que seja por aí...

Gostei de ler.
Beijinho

Fláh said...

Acho que nos falta coragem, coragem pra dar a cara a tapa e mostrar nossa posição.

"Devia ter arriscado mais, ter chorado mais, ter feito o que eu queria fazer.."

Fláh said...

Acho que nos falta coragem, coragem de dar a cara a tapa e mostrar quais são nossas opiniões.

"Devia ter arriscado mais, ter chorado mais, ter feito o que eu queria fazer..."

MIMO-TE said...

Pois é!!! Excelente a tua postragem!

Grande mulher, sexo forte, corajosa e que realmente vive, vê, sente e reage :) Sinto-me tão bem por ser mulher nestas alturas.

Parabéns para ti, mulher!

Outonodesconhecido said...

veludinho fiquei encantada com o teu post, muito bem escrito e deveras interessante.
Voltaste à musica de um dos filmes que mais me marcou, embor anão o tivesse citado.
Bjs
Jasmim

Filoxera said...

Pois, amiga, faltam tomates a esta gente.
Parabéns por + 1 post exemplar.
Beijos.

Pekenina said...

Às tantas é um pouco dos dois: um povo que sofre de falta de carácter e que se acobarda. Não em todas as situações, mas nesta talvez será um pouco.

Oliver Pickwick said...

Muito bem, Velvet! Um artigo brilhante, digno de grandes colunistas, de grandes jornais.
Conhecia um pouco a respeito dessa mulher tão corajosa, mas este post trouxe muito mais esclarecimentos.
Seu início de ano está prometendo.
Beijos!

Olá!! said...

Parabéns pelo post Blue Velvet...há tantos exemplos de mulheres de coragem que nunca surgem a publico...
Um beijo enorme

Luís Galego said...

a coragem e a verticalidade têm um preço...infelizmente!!!

aqui-há-gato said...

Grande post!
Destaco a religião como o grande motor de vida daqueles povos...
"Tinha que procurar outro Deus”
e a coragem de alguém que consegue ver o outro lado do mundo, da fé, da vida!


O Gato

JCA said...

desafios... existem muitos,

coragem para aceitar os desafios... isso já é outro tanto!

Lutar para vencer, lutar para que se possa viver em dignidade, lutar para se poder viver em paz!

e lá estamos nós nesta pescadinha de rabo na boca: lutar para e pela paz!