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13 June 2008

PESSOA


"Criei em mim várias personalidades.
Crio personalidades constantemente.
Cada sonho meu é imediatamente, logo ao aparecer sonhado, encarnado numa outra pessoa, que passa a sonhá-lo, e eu não."

Faz hoje 120 anos que Fernando António Nogueira Pessoa ou Alberto ou Ricardo ou Álvaro, nasceu. Que me importa como ele assinava? O que me importa é que tudo o que escreveu me fica no coração.
E há coisas que me vêm direitas à alma.
Como esta.

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso?
Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio?
Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.

Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?

Ou esta:

«Irrita-me a felicidade de todos estes homens que não sabem que são infelizes. A sua vida humana é cheia de tudo quanto constituiria uma série de angústias para uma sensibilidade verdadeira.
Mas, como a sua verdadeira vida é vegetativa, o que sofrem passa por eles sem lhes tocar na alma, e vivem uma vida que se pode comparar somente à de um homem com dor de dentes que ouvesse recebido uma fortuna - a fortuna autêntica de estar vivendo sem dar por isso, o maior dom que os deuses concedem, porque é o dom de lhes ser semelhante, superior como eles (ainda que de outro modo) à alegria e à dor..
Por isto, contudo, os amo a todos. Meus queridos vegetais!»

20 February 2008

EMOÇÕES


Comecei a ler com 3 anos. A minha querida avó (um dia ainda vos falo dela) ensinou-me a ler juntando letrinha a letrinha.
Eu tive 2 avós (como toda a gente…), mas tive uma boa e uma má. Nada que me perturbe. Esqueci a má e lembro a boa todos os dias.
Definitivamente, um dia ainda vos falo da minha avó.
O facto é que desde que descobri o prazer da leitura, nunca mais o abandonei. E desenvolvi o vício de sublinhar tudo o que me chama a atenção num livro. Tenho até lápis próprios para isso.
Uma dessas frases é de Madame de Bovary: eu prefiro emoções a paisagens.
Nunca mais a esqueci.
Esta e outras que se tornam-se tão íntimas que até poderiam ter sido escrita por nós. Sempre preferi as emoções às paisagens, o que não é, definitivamente, uma boa ideia. Basta ver como acabou a Bovary…Mas as paisagens estão lá, a espera do nosso embevecimento e da admiração por algo que nos ultrapassa. Como os quadros de Van Gogh. Penso nos seus malmequeres. Aquele tipo de paisagem, encanta -me: há algo de profundo e misterioso. Parado. Quieto. Nada acontece, há um compasso de espera ou a certeza de que algo por ali passou e não sabemos o que foi. Não conseguimos penetrar naquelas imensas flores que nos olham nos olhos e que nos dizem tudo ou nada. Paisagens assim, apesar disso, interessam-me porque estão recobertas de emoções, ou pelo menos, eu sinto-as.
Já Clarice Lispector (sempre ela …) dizia que quem tem medo da vida que recubra cada fibra do seu corpo com uma película protectora...
Podemos até fazê-lo, mas não se vive.
E é isso que acontece, hoje em dia.
Cada dia se vive menos. Cada dia mais as pessoas buscam paisagens e fogem das emoções.
Têm medo dos nervos à flor da pele, têm medo da flor da pele, da flor e da pele
E de tudo que se pareça, minimamente, com entrega, com sentimentos e profundas carícias. Com tudo que seja toque, o mais profundo dos toques, que atravessa a pele e chega onde deve chegar: dentro de nós.
Que nos arrepia e nos estremece.
Porto seguro e também tempestuoso. Mas porto, onde devem chegar e partir pessoas. Não apenas um ancoradouro onde nos deixamos ficar a admirar o sol que se põe.
Nada contra a paisagem. Mas, apesar de não ser boa ideia, continuo a preferir as emoções.