Não gosto de falar dos meus afectos pelo muito que me expõe, mas, em contrapartida, decidi falar aqui de um tema que me interessa sobremaneira: a Sedução.
E, quando se aborda este, lembro-me logo do verso do David Mourão-Ferreira (um Mestre nesta disciplina!):
"Ai da sedução que não é uma arte! Ai da arte que não é sedução!".Tenho de definir o conceito de "sedução" que me interessa:
Sedução (do latim “se ducere”- conduzir, inclinar para si) para mim é encantar, envolver, cativar (o “apprivoiser” a que a raposa convidava o Petit Prince) e, nesse sentido, é inerente a qualquer estado de enamoramento (mesmo que este seja unilateral).
Sedução, contudo, também tem um significado de encenação, de jogo, de artifício para conseguir o fim visado, que é, em regra (pelo menos, no campo masculino) a consumação sexual.
Neste sentido, o sedutor tem como arquétipos as figuras de Don Juan e a do Vicomte de Valmont, do livro de Choderlos de Laclos, “Les Liaisons Dangereuses” (teve, pelo menos, duas adaptações cinematográficas).
Ora, com estes sedutores “predadores” eu tenho muito pouco que ver (“não faz o meu género”, para usar um francesismo).
Comecei a ler muito cedo, e tive a sorte de estar rodeada de gente muito culta. Se do meu pai herdei o jeito para escrever, (não direi talento, por pura falsa modéstia), da minha mãe herdei a curiosidade pela vida, pelas pessoas, pelos comportamentos, filosoficamente falando, e muitos têm sido ao longo da vida, os escritores que sobre isto tudo se têm debruçado, e a eles tenho ido beber a informação que me ajuda a compreender os outros.
Confesso que já pouca coisa me espanta.
Como disse alguém, com alguma graça” Depois de ver um porco a andar de bicicleta, já nada me espanta”.
Ora, eu já vi muitos.
Há, no entanto perguntas que continuam a acompanhar-me, porque tenho a absoluta necessidade de compreender o sentido da nossa existência.
Porque um dia a pergunta surge. Nalguns casos mais cedo que tarde.
Noutros tarde demais.
Noutros ainda, a pergunta fica e andamos anos à procura da resposta.
O que nos move? Qual o verdadeiro sentido da vida? Para que damos vida a seres que amamos acima de tudo, quando sabemos que inexoravelmente, eles começam a morrer no dia em que nascem?
Tenho poucas certezas na vida (aliás, acho que quem as tem, é de certeza, uma pessoa muito limitada), mas acredito que estamos mal programados. Na medida em que só aprendemos o caminho quando erramos, quando nos enganamos. Aí sim, ficamos aptos para passos mais firmes.
Mas nesse caminhar, vamos aprendendo, e, em princípio, evitamos trilhar caminhos que já fizemos antes e nos provaram não ser os certos.
É claro que este sinuoso caminho nos conduz à transformação pessoal. Pelo meio, haverá necessidade de revermos crenças e modos de vida. Seremos levados a equacionar se vale a pena certas coisas. Então colocamos tudo em causa. Separa-se o trigo do joio, clarificam-se valores, traçam-se objectivos. Estimula-se a criatividade, abrem-se novos caminhos para nos aperfeiçoarmos como seres humanos.
Mas na Sedução, quando entramos por esse caminho, muitas vezes percorremos caminhos já percorridos e usamos exactamente o mesmo artifício para construir a teia.
E falamos de pele, de química…
Que pele? Que química?
Se nem nos tocamos!!!!
E os perigos da Sedução são muitos, porque:
Se se trata de um jogo e só nós conhecemos as regras, inevitavelmente o outro sairá magoado, depois de seduzido e abandonado.
Se a intenção é seduzir para capturar alguém e levar esse alguém a amar-nos, vamos mostrar só a nossa face boa, mostrando as qualidades, escondendo os defeitos e um dia, quando a fase de sedução e do encantamento acabar, tudo cai por terra, e as mais das vezes, só sobra desamor e raiva por nos sentirmos enganados.
Assim, só há duas formas de sedução de que gosto:
A que dura uma noite, porque não uma Noite de Verão, como num Sonho, com luxo, com perfume, com beleza…
Ou a do Príncipezinho:
O Principezinho pede ao aviador que lhe desenhe uma ovelha, mas nenhuma das ovelhas que ele rabisca, por mais cuidados que tenha, o satisfazem: ora parece doente, ora é velha, e quantas mais ovelhas o aviador continuasse a desenhar, mais defeitos o Principezinho lhe poria.
A única solução foi fazer uma caixa e dizer: o que tu queres está lá dentro.
Este acto de deixar à consideração do outro, de o fazer adivinhar como será o que está dentro da caixa, torna o seu conteúdo "perfeito" ou pelo menos interessante/apaixonante aos olhos da pessoa que não sabe o que está guardado; e a chave muitas vezes está não só na forma como vamos desvendando o que está escondido da vista, mas também o facto de a pessoa ter de "abrir a caixa".
Por vezes, descobrimos depois que o conteúdo da caixa não é bem o que queríamos à partida, mas afinal até nos dá mais jeito, outras que afinal não nos interessa mesmo nada... Mas a nossa disponibilidade para tentar está muitas vezes condicionada pelo facto de nos ser apresentada a priori uma ovelha com todos os seus defeitos e virtudes declarados, ou uma caixa fechada, onde pode estar qualquer coisa.
Só que acho que hoje em dia, já ninguém lê o Príncipezinho, porque ninguém se sente responsável por quem cativa (seduz).
Por vezes, descobrimos depois que o conteúdo da caixa não é bem o que queríamos à partida, mas afinal até nos dá mais jeito, outras que afinal não nos interessa mesmo nada... Mas a nossa disponibilidade para tentar está muitas vezes condicionada pelo facto de nos ser apresentada a priori uma ovelha com todos os seus defeitos e virtudes declarados, ou uma caixa fechada, onde pode estar qualquer coisa.
Só que acho que hoje em dia, já ninguém lê o Príncipezinho, porque ninguém se sente responsável por quem cativa (seduz).
3 nhận xét :
Bemm Blue, na verdade já escreveste quase tudo. sedução é obviamente um jogo e não sei se seria interessante se o outro conhecesse as regras. parece-me importante que ambos saibam o que estão a jogar. a surpresa faz parte da arte de seduzir. e tinha razão o DMF quando afirmava que a arte é sedução.
excelente reflexão sem dúvida. espero que tenhas passado uma Páscoa excelente.
beijos
Ah! Principezinho, much better! És, de facto, uma garota subtil e consciente dos seus actos. Xiitas de plantão, baixem as armas!
Velvet, gosto de vê-la nestes artigos coerentes e explicitamente centrados. Até imagino a expressão do seu rosto enquanto escreve: óculos na ponta do nariz, ar de filósofo cartesiano.
E pensar que este background não dependeu de conhecimentos por alisar muitos bancos de faculdade, vez que a sua formação acadêmica é outra. Eles vêem da perspicácia do mero "olhar em volta".
Muito bem! És uma articulista sedutora.
Beijos!
Olha amiga, aqui abordas algo que nos dias de hoje parece ser tudo menos o que realmente é.
Porque seduzir, pretende-se que seja algo que conduza ao afecto. No entanto hoje, tem conotações totalmente diferentes...
Muito havia a dizer...
Beijinho
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